domingo, 3 de abril de 2011

As Cores de Uma Trajetória - Capítulo 6

Terceira série ginasial.













Eu já era um garoto de 16 anos, voz grave, de barítono, integrante do coral do seminário. Nova professora de desenho, dona Rosalina Nizer. Loiríssima, sangue germânico, não menos exigente que D. Lurdes Brunetta e seguindo a mesma linha de desenho. Esforçava-me o máximo e o dez não vinha. Cacete!!! (ops, isso não podia ser dito na época). Será que ela também não notava minha genialidade? Ela sabia que eu era habilidoso, mas o dez não vinha, pô.




Nessa época, alguém me presenteou com uma aquarela de seis cores (não me lembro quem foi). Dessas aquarelas tipo pedra, grudadas sobre uma palheta de cartão, acompanhadas de um pinçel que parecia piaçava. Era preciso diluir a aquarela com um pouco de água, tão dura que era. Para mim, era uma grande novidade.


Reproduzia tudo que estivesse ao meu alcançe. O Marcos Rossoni, uma classe acima da minha, muito meu amigo, emprestou-me seu caderno de desenho do ano anterior, que copiei. Muitos deles ainda conservo. Essa aquarela era de difícil uso, mas ótima para meu desenvolvimento. Eu queria fazer algo a mais e melhor do que o trivial para ter a admiração dos colegas. Já tinha vários amigos. Meu relacionamento social melhorava a medida que eu fazia mais amigos.




Retrocedendo um pouco no tempo, acho que eu estava na primeira série do ginásio. sentado ao meu lado, na sala de estudos, havia um garoto de nome Vitório Canossa que desenhava bem. Desenhou o nosso seminário (réplica estilizada de um dos tantos castelos do Vale do "L'oire") de forma tão perfeita que eu não me cansava de olhar e admirar o desenho e o autor. Foi meu primeir ídolo. Ele nunca soube disso. Mas não passou desse desenho, meu ídolo sumiu, desapareceu, escafedeu-se. Outro garoto, este da minha classe, habilidoso, era bem melhor que eu. Meu concorrente direto. Anos depois (cerca de 1945), encontrei-o tão modificado, tão diferente, que no primeiro instante não o reconheci. Comentando o fato, disse-me que ninca mais fez nada, que nunca percebera que, às escondidas, eu o admirava. Talentoa existiam, e muitos, mas pouco evoluíram, ou talvez nem tivessem consciência. Afinal, o objetivo comum era chegar ao sacerdócio. Saber a fundo português, latim, francês, inglês, história, geografia, matemática... Matemática?.. Pra que? Eu precisava saber fazer sermões empolgantes, emocionantes. Dois mais dois e dois vezes dois, eu já sabia fazer. Poderia pregar o evangelho através da música, do desenho, desenhar santos virgens, anjos, céus e Terra, cantar louvores à Nossa Senhora. Matemática!?.. Que merda! (ops, de novo... Isso não pode dizer)












quinta-feira, 24 de março de 2011

As Cores de Uma Trajetória - Capítulo 5

Segunda Série Ginasial.

Nova professora de desenho. Dona Lurdes Brunetta, estatura média, corpo escultural, cabelos castanho escuros, pele branca rosada e sedosa, dentes de marfim, uma deusa. Fato inédito num seminário com cerca de 80 garotos e vários padres. O elemento feminino, até então, só era visto na cozinha ou nas missas dominicais na matriz.

Dona Lurdes seguiu a mesma linha de desenho do ano anterior: o geométrico, porém, com a liberdade de cada um colorir a seu modo. Desta vez, eu já tinha uma caixa de lápis de cor com 12 unidades da mesma John Faber.

Com essa profusão de cores, eu viajava para o mundo da fantasia sem barreiras. Compensava no desenho todas as minhas frustrações, e as das demais matérias. Havia, por parte dos padres, um estímulo velado para competir um com o outro, para ver quem era o melhor em todas as matérias. Competição sadia, obviamente. Possibilitava o crescimento cultural, o estímulo ao conhecimento, o empenho maior diante das dificuldades. Desenho e música eram a minha salvação. Demais matérias, eu era razoável, mas matemática... Péssimo! Acho que os professores me deixavam passar de ano com pena de mim.

Será que Picasso, Van Gogh ou Portinari também eram ruins de matemática? Michelangelo e Da Vinci, sei que não eram. Mas naquela época, eu nem sabia quem eles eram, e nem que eles existiam. Daí a razão de eu achar que eu era gênio, "pero no mucho"... Quase!... Hummm... Já tinha minhas dúvidas.

Mas... A classe toda já me notava, mas só por causa disso. Um dos colegas, o Berté, um dia, dissera-me que eu tirava notas melhores que ele em desenho porque eu tinha lápis melhores. Não tive dúvidas. Desafio aceito. Emprestei-lhe meus lápis. Ahhh... Assim mesmo, ele não conseguiu nota melhor que a minha. Não bastava ter lápis melhores. Vejam quanta idiotice na cabecinha pequena de dois "piás", um querendo ser melhor que o outro.

Muito tempo depois, encontrei Berté, comerciante bem sucedido e, ao recordar velhos tempos, comentei o fato acima, mas ele disse qua não se lembrava de nada. Disse-me que adorava pintura e colecionava obras de arte. Mas... Ele não se manifestou a respeito da minha obra. Não fez menção de comprar. Acho que não me perdoou por não ter me superado no desenho. Ele era um dos primeiros alunos da classe.

Não me contentava com os oito ou nove que a professora me dava. Eu queira o dez. Esse dez não vinha. O ano acabou, e o de não veio. Dona Lurdes não foi capaz de entender minha genialidade... Aquela incompetente. Acho que ficou despeitada.

Aqui estão alguns dos desenhos da segunda série:








domingo, 6 de março de 2011

Concorra a um desenho!!







Quer concorrer a um desses desenhos exclusivos feitas por mim?


Então me siga e divulgue o melhor blogg dos últimos tempos!! Os primeiros 100 seguidores concorrerão aos desenhos acima!!

Os desenhos medem 29,7 x 42,0 cm, feitos em papel Canson e lápis aquerelável.
O sorteio será feito através da Loteria Federal cuja data de sorteio será definida tão logo atingir o centésimo seguidor.

quinta-feira, 3 de março de 2011

As Cores de Uma Trajetória - Capítulo 4

Na época, começo da década de 60, era febre "estudar para padre ou freira". Eu aderi a essa febre. Queria ser padre (olahe de novo a merda que ia dar).


E no começo de fevereiro de 1962, lá fui eu para o seminário de Ibicaré (SC), então com 12 anos, quase 13. Quase adolescente, baixinho (Van Gogh, Picasso e Portinari também eram), arredio, tímido. Fiz avaliação para começar o primeiro ano do ginásio (no meu tempo tinha curso ginasial). Meu Deus! Não entendi nada do que os professores me perguntaram! Fui terminar o quarto ano primário no colégio local das freiras, pois no seminário só tinha o curso ginasial.


No colégio das freiras, não tínhamos aula de desenho. Todas as matérias eram muito difíceis. Acompanhava com muita dificuldade. Deixei de ser o quase gênio. Descobri que o gênio tinha ficado na Secção São Miguel, comunidade onde morava (ainda mora minha família).


Sentía-me só, isolado. Não era ninguém. Ninguém reconhecia em mim o geniozinho das cores. Pra piorar ainda mais a situação, minha timidez me impedia de fazer amizades. Às vezes, sentado no jardim, à sombra de um coqueiro olhando o trem passar pelo Vale do Rio do Peixe, eu chorava. Tudo era estranho, e ninguem me dava bola. Nem bola eu jogava. Assim, eu descobri que eu não era nada, ninguem, um pobre diabo cheio de complexos, incapaz de tudo, de fazer amizades, de aprender, jogar bola. Nas aulas de português, eu não sabia sequer o que era verbo. Matemática não passava de 2+2 e 2x2. De gênio metido a semi-analfabeto insignificante, foi tamanha derrocada que, se eu conhecesse Coca-Cola na época, tomaria um porre.


Com muita dificuldade, consegui passar de ano. Passei "raspando", mas passei.


No ano seguinte comecei o curso ginasial, primeira série. Na extensa grade de matérias, lá estava o Desenho. O professor, um padre holandês, Pe Sheng. Alto, magro, bem-humorado, habilidoso, sarcástico, sutil, afetuoso e cínico, foi conquistando minha confiança.


Na primeira aula de desenho, quadriculou a lousa, desenhou pouco a pouco uma figura geométrica. Nós o acompanhávamos passo a passo. De repente, um elefante. Coisa estranha. Não era nada disso que eu sabia fazer. Meu desenho ficou igual ao dos demais. Notei que tinha muita gente bem melhor que eu. O geniozinho acabava de ser superado.

Esse é o desenho, refeito algum temo depois com tinta guache. O defeito é da época.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

As Cores de uma Trajetória - Capítulo 3

Meus Lápis, minha habilidade com as cores tornaram-me muito popular e prestigiado na escola (não era tanto assim). Fazia sucesso. Era considerado muito inteligente. Quase um gênio (olha aí a merda feita). Disseram-me qu eu era tudo isso e eu acreditei. Nas aulas de desenho, o meu sempre era o mais bonito; pinheiros, arco-iris, flores, arabescos... Ainda bem que Picasso, Portinari, Van Gogh não sabiam de miha existência, se não estariam preocupados (enfartados de ódio). Eu era sucesso. Até pedido de casamento rejeitei, mas namoradas eu tinha várias.
Agora dizem que sou metido. Puro despeito! Metido não... Sou o máximo!!!

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

As Cores de Uma Trajetória - Capítulo 2

Numa ocasião, minha prim Zélia, mesma idade minha, ao visitar-nos após o natal, mostrou-me o presente que ganhara: uma caixa com meia dúzia de lápis de cor John Faber. Fez um desenho qualquer usando aquela profusõ de cores (seis cores). Pedi que me deixasse fazer um desenho. Era mais ou menos assim:



Aqui está reproduzida a idéia. Obviamente, as cores não são exatamente as mesmas da época. A Zélia achou bonito. Mostrei para mais pessoas que também gostaram. Tive múltiplos orgasmos artísticos. Não dei mais sussego à minha mãe enquanto ela não comprasse um estojo igual.

Uma semana depois, sob promessas de ser muito mais obediente (já era), cuidar melhor dos meus irmãos menores (sou o mais velho), ganhei a minha sonhada, desejada, cobiçada e almejada caixinha de meia dúzia de lápis de cor John Faber. Eu era o garoto mais feliz do mundo (como era pequeno meu mundo). Eu tinha seis cores em meu poder.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

As Cores de Uma Tragetória - Capítulo 1

O natal sempre exerceu em mim grande fascínio. Era somente nessa data em que ganhávamos presentes. Mas não era só por isso. Era e ainda é costume enfeitar a árvore de natal, que, na minha infância, eu só conhecia por pinheirinho. Pinheirinho porque se cortava um pequeno pinheiro araucária, que tínhamos aos montes.
Quando íamos a capela da comunidade no natal, aquele pinheirinho me encantava. Suas bolas coloridas, as fitas de papel crepom, os chumaços de algodão simulando neve me levavam para um mundo de contos de fadas, luzes, estrelas, mil cores, brinquedos etc.
Comecei a frequentar a escola local já com oito anos de idade (naquele tempo, no meio rural, começava-se a estudar tarde), então, conversando com minhas colegas de classe, fiquei sabendo como se enfeitava um pinheirinho em casa, uma vez que não se tinha dinheiro pra nada, a não ser para comprar cola, papel crepom e algodão, que eram coisas baratas.
E assim enfeitei meu primeiro pinheirinho. As bolas eram cascas de ovos que minha mãe guardava e eu as decorava. As velas eram gravetos, hastes de arbustos cortados e decorados com papel crepom ou com papel laminado dos maços de cigarro. Os maços de cigarro eram envolvidos com papel laminado de cor prata, que tinha muita utilidade. Eu recolhia do chão todos os maços jogados. Vasculhava a mata local em busca de ninhos de pássaros e sequestrava-lhes os ovos, que eram cuidadosamente furados e decorados para ficarem em destaque no meu pinheirinho.
Eu queria que meu pinheirinho fosse o mais bonito da comunidade (depois do da capela, é claro). E conseguia. Exercia toda a minha criatividade e ássava as descobertas às minhas colegas. Embora soubessem como fazer, faltavam-lhes habilidade.
Fui crescendo, guardava os trocados que ganhava e acabava comprando mais material, e assim meu pinheirinho ficou famoso, era o mais bonito da comunidade.